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Ciência
Quinta - 23 de Abril de 2015 às 19:00
Por: *JOSÉ ANTONIO LEMOS DOS SANTOS

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Um grupo de pesquisadores chineses realizou, pela primeira vez na História, experimento em que modificou genes de embriões humanos, detonando controvérsia devido a uma série de questões éticas. Sempre cautelosos quanto a esse tipo de pesquisa, cientistas temem que a modificação de embriões humanos, mesmo que com o objetivo de curar doenças genéticas, tenha consequências imprevisíveis sobre gerações futuras. A experiência também traz preocupações de seu uso em iniciativas de eugenia, filosofia surgida no século XIX que prega a “melhoria” das populações por meio do casamento de pessoas com características supostamente “superiores” e eliminação ou esterilização das ditas “indesejadas” — classificação que, dependendo da sociedade e da época, incluiu desde doentes mentais a homossexuais, passando por negros, índios e judeus — e resultou em pesadelos como o nazismo.

Rumores de que a pesquisa vinha sendo feita circulam no meio acadêmico desde março. Segundo o site da revista “Nature”, tanto a “Nature” quanto a “Science”, duas das mais prestigiadas publicações científicas do mundo, recusaram-se a publicar o artigo sobre o experimento pelo menos em parte devido a questões éticas que o trabalho suscita. Mas a equipe de pesquisadores, liderada pelo professor Junjiu Huang, da Universidade de Sun Yat-sen em Guangzhou, na China, conseguiu que seu estudo fosse aceito pelo bem menos conhecido periódico “Protein & Cell”.

Huang e seus colegas tentaram driblar as preocupações éticas quanto ao experimento usando embriões “inviáveis”, ou seja, que não resultariam em nascimentos, obtidos em clínicas de fertilidade locais. A equipe buscou modificar o gene responsável pela beta-talassemia, um distúrbio sanguíneo fatal, usando a ténica de edição genética conhecida como CRISPR/Cas9. Segundo os próprios pesquisadores, contudo, seus resultados revelam sérios obstáculos ao uso do método em aplicações médicas.

— Acredito que este é o primeiro estudo de CRISPR/Cas9 aplicado a embriões humanos e, sendo assim, o trabalho é um marco, mas também é motivo de cautela — disse ao site da “Nature” o biólogo genético George Daley, da Escola de Medicina de Harvard, em Boston, nos EUA. — A pesquisa deve servir de aviso a qualquer cientista que pensa que a tecnologia está pronta para tentar erradicar doenças genéticas.

No experimento, os cientistas injetaram nos embriões o complexo de enzimas CRISPR/Cas9, uma espécie de “tesoura” molecular que corta e une o DNA em locais específicos. O complexo pode ser programado para atuar sobre um gene problemático, que, então, é substituído ou reparado por outra molécula introduzida ao mesmo tempo. “O sistema é bastante estudado em células humanas adultas e em embriões de animais. Mas nunca houve pesquisas publicadas sobre o seu uso em embriões humanos”, lembra o site da “Nature”.

'NÃO SOMOS RATOS DE LABORATÓRIO'

Os cientistas testaram a técnica em 86 embriões. Após 48 horas, os pesquisadores testaram 54 dos 71 embriões sobreviventes e identificaram que desses, 28 tinham sido modificados com sucesso. De acordo com próprio grupo de cientistas, a baixa taxa de sucesso indica que o processo não será aplicado em embriões viáveis tão cedo, já que, para isso, a pesquisa precisaria alcançar 100% de eficácia.

Em tese, a técnica pode servir de base para o tratamento de doenças genéticas. No entanto, a comunidade científica tem sérias preocupações quanto a seu uso na medicina. Mudanças no código genético podem não apenas alterar o ser humano cujo DNA estaria sendo “reparado”, mas também seus filhos, netos, bisnetos etc. Ou seja, uma alteração no gene de uma pessoa pode resultar em gerações de humanos geneticamente modificados, sendo que ainda não há pesquisas para saber quais seriam as consequências disso.

No último dia 12 de março, a revista “Nature” publicou um alerta sobre pesquisas com embriões humanos, pedindo uma moratória total nesse tipo de estudo. Presidente da Aliança para a Medicina Regenerativa, o cientista Edward Lanphier e outros quatro pesquisadores pediram à comunidade mundial para não realizar experimentos nessa linha. “Não somos ratos de laboratório, muito menos algo como um milho transgênico. Por décadas, os países desenvolvidos debateram a modificação de genes em células reprodutivas e se posicionaram contra isso”, disse Lanphier ao GLOBO em março.





Fonte: O Globo

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